Época - Como o Brasil alcançou 30% das operações de transferência de valores da Ripple
9 de janeiro de 2020
MARCELO MOURA
A internet tornou possível enviar fotos e filmes de um canto a outro do mundo, em questão de segundos, praticamente de graça. O envio de dinheiro, contudo, não evoluiu da mesma forma. Uma transferência bancária internacional pode levar três dias. “É mais rápido eu encher uma mala de dinheiro, ir para o aeroporto de Guarulhos e levar pessoalmente”, diz Eric van Miltenburg, vice-presidente sênior de operações globais da Ripple. Em seguida, esclarece: não tem intenção de cometer essa possível irregularidade. Criadora da XRP, terceira maior criptomoeda do mundo em capitalização, também conhecida pelo nome da empresa, a Ripple consegue fazer a tal transferência de valores em apenas três segundos. É por outro motivo, portanto, que Eric viaja com frequência para o Brasil: hoje, o país responde por 30% das operações da empresa no mundo. O volume de negócios justificou a abertura, em junho, de um escritório em São Paulo — o sétimo, depois de Estados Unidos (2), Reino Unido, Austrália, Cingapura e Índia.
Uma medida que usamos é a quantidade de transferências, sem considerar o total de dinheiro entrando ou saindo. Por esse critério, o Brasil representa 30% de todas transações da Ripple.
Uau.
Sim, é bem significativo.
Por que Estados Unidos e Europa não estão entre os principais mercados da RippleNet?
Como estamos construindo uma rede global, todo país nos interessa. Mas os mais desenvolvidos tendem a ter uma estrutura um pouco mais eficiente de transferência internacional de dinheiro. Podemos melhorar o fluxo de pagamentos entre os Estados Unidos e a Zona do Euro? Certamente. Mas nossa vantagem competitiva é bem maior em corredores mais exóticos, como entre Brasil e Tailândia. Portanto, nossos principais mercados são evidentemente fortes, mas não são as principais economias. É um pouco contra intuitivo.
Onde estão as grandes ineficiências na transferência internacional de dinheiro?
O sistema tradicional de transferências bancárias internacionais é muito ineficiente, e isso resulta na cobrança de taxas elevadas. Quanto menor o valor da transferência, maior o custo proporcional da ineficiência. Portanto, estamos buscando mercados com grande volume de transferências de baixo valor. Isso tem acontecido na Ásia, de maneira geral, muito por causa de compras online, e na Índia mais especificamente pela imigração de indianos para outras partes do mundo.
O que muda com a instalação de um escritório no Brasil?
A possibilidade de interagir pessoalmente com os clientes faz grande diferença. Viajar para o Brasil com frequência funcionou até agora, mas é diferente de estar aqui com o Luiz (Luiz Antonio Sacco, diretor geral da empresa para Brasil e América do Sul, também presente durante a entrevista). Será mais fácil investir no relacionamento, entender as necessidades e os desafios. Esse ajuste fino permite aumentar a eficiência e destravar oportunidades.
Quais oportunidades são destravadas por transferências mais eficientes?
Quando conseguimos baixar o custo da transferência de US$ 20 para apenas US$ 2, certos negócios de exportação que eram inviáveis tornam-se possíveis e vantajosos. Outro ganho de abrir um escritório no Brasil, esse para a Ripple, é aprender com as boas ideias do país e aplicar no resto do mundo.
O ganho individual parece bem claro. Qual é o ganho coletivo?
Pelos nossos cálculos, o sistema tradicional de transferências bancárias mantém US$ 10 trilhões parados. Parados, apenas para funcionar. Baixar o custo das transferências pode destravar modelos de negócios e oportunidades hoje inviáveis. Pode também aumentar dramaticamente o alcance dos bancos. Hoje, cerca de 2 bilhões de pessoas no mundo estão desbancarizadas porque os custos da operação bancária são altos demais para o pequeno volume de dinheiro que elas têm.
Como as criptomoedas aumentam a eficiência das transferências?
Para uma empresa brasileira fazer negócios no Japão, o normal é abrir uma conta lá e outra no Brasil. Quando transfere dinheiro, as notas não saem fisicamente daqui e vão para lá: o banco daqui recolhe um valor, o banco de lá entrega outro e depois os dois se acertam. Para honrar essas ordens de pagamento, os bancos precisam manter dinheiro parado. Precisam lidar com imprecisões de uma operação que pode levar dias — como a variação da cotação das moedas durante o tempo de transferência. Por isso, movimentar valores com blockchain é bem atraente. Com bitcoin, a operação leva entre 10 e 20 minutos (e custa US$ 3). Com XRP, é ainda mais rápido: 3 segundos, ao custo de US$ 0,0011.
Qual a sua opinião sobre a Libra, criptomoeda que o Facebook planeja lançar e que encontra oposição de governos como o da França?
Acho o documento de proposição da Libra bem interessante. Em vários sentidos, corrobora o que nós estamos fazendo e pesquisando há quatro anos: os benefícios de usar recursos digitais para dar eficiência a pagamentos. Em especial, pagamentos internacionais. É justamente a nossa especialidade. Mas nós estamos trabalhando, nós somos realidade, eles não. E como trabalhamos em parceria com mais de 300 bancos [no Brasil, com o Banco Rendimento, Santander e BeeTech Global] e com dezenas de órgãos regulatórios ao redor do mundo, estamos do lado dos governos, sem polêmica.
Qual a diferença conceitual entre o XRP e a Libra?
O XRP é uma criptomoeda sem controle central, uma permissão de código aberto. Não a comandamos, somos apenas um grande proponente. Com ela, não queremos ameaçar moedas estabelecidas. Ao contrário, queremos reforçá-las. Ao aumentar a eficiência de uma transferência bancária entre Brasil e Canadá, eu não ameaço o Real ou o Dólar Canadense. Ao contrário, eu reforço a importância delas. Já o Facebook tenta criar uma moeda, né? Segundo a proposta, a Libra será atrelada a uma cesta de moedas, com possibilidade de uso na compra e na venda de produtos e serviços. Acho que isso incomoda o governo da França. Dizem que o Facebook tenta se afirmar como um banco central mundial … Acho difícil. De qualquer maneira, duvido que no futuro alguma moeda consiga ter um papel dominante, seja a Libra ou mesmo o dólar, que acabou virando uma moeda global de facto. Conforme a ideia de moeda global parece perder força, o mundo precisa de um meio de pagamento neutro para fazer a ponte entre moedas. É aí que entramos.
Fonte: https://epocanegocios.globo.com/Tecnologia/noticia/2019/11/como-o-brasil-alcancou-30-das-operacoes-de-transferencia-de-criptomoedas-da-ripple.html
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